O ex-ministro da Secretaria de Governo Geddel
Vieira Lima - 22/11/2016 (André Coelho/Agência o Globo)
Doleiro levou mala de propina
até na festa de 15 anos da filha do ex-ministro. ‘Geddel demonstrava
naturalidade ao receber os valores’, diz.
Operador financeiro dos esquemas de corrupção do
ex-deputado Eduardo Cunha e do chamado “PMDB
da Câmara”, o doleiro Lúcio
Funaro revela em detalhes, no acordo de delação, como funcionava a
entrega de malas de propina para o ex-ministro da Secretaria de Governo Geddel Vieira Lima.
Na edição que começou a circular nesta
sexta-feira, VEJA revela com exclusividade os principais trechos do
roteiro apresentado pelo doleiro no acordo. Segundo
Funaro, em apenas dois anos, 2014 e 2015, Geddel recebeu 11,4 milhões de reais
em dinheiro vivo divididos em 11 entregas operadas pelo doleiro. Os pacotes de
dinheiro eram levados em um jato particular e entregue ao próprio ex-ministro
em um hangar privado do Aeroporto Internacional de Salvador. Funaro também cita
entregas em hotéis de São Paulo e da capital baiana. Ele diz ter entregue
propina até na festa de 15 anos da filha de Geddel.
“Ao descer do avião (com a mala de dinheiro), era
indagado por Geddel a respeito da quantia que estava sendo entregue. Geddel
demonstrava naturalidade ao receber os valores”, diz Funaro. “Recorda-se de ter
entregue dinheiro para Geddel em São Paulo, no Hotel Renaissense, na Alameda
Santos, e uma vez em Salvador, no Hotel Pestana, no dia em que a filha de
Geddel estava fazendo uma festa para comemorar seus 15 anos”, complementa o
doleiro.
Geddel voltou a ser preso em regime fechado, pela Polícia
Federal, na manhã desta sexta-feira. Ele foi detido no último dia 3 de julho, por decisão do juiz federal
Vallisney de Souza Oliveira, tendo sido transferido para a prisão domiciliar
nove dias depois, por decisão do desembargador Ney Belo. Agora, o ex-ministro
será levado de volta para Brasília, onde cumprirá a nova detenção preventiva,
também assinada por Vallisney. O juiz ainda determinou a prisão do advogado Gustavo
Ferraz e mandados de busca e apreensão nas casas de Geddel, da mãe dele, e de
Ferraz.
A ação acontece três dias depois da Operação
Tesouro Perdido, a descoberta de um apartamento que serviria de “bunker” para o
ex-ministro. Após uma denúncia anônima, a PF fez no imóvel maior apreensão de
dinheiro em espécie da história do país: 51 milhões de reais. Segundo os
policiais, as digitais do ex-ministro foram encontradas nas cédulas e nas
caixas que guardavam o valor dentro do apartamento.
No acordo de delação, o doleiro Lúcio Funaro
apresentou aos investigadores da Procuradoria-Geral da República (PGR)
registros de trocas de mensagens de celular com Geddel, históricos de voos do
jatinho que fazia o “delivery” das malas para o ex-ministro, planilhas de pagamentos
e, em alguns casos, até extratos bancários das operações. Amigo pessoal de
Temer, Geddel foi ministro da Secretaria de Governo e tinha aval do presidente
para comandar as relações do Planalto com o Congresso. Na delação, o doleiro
narra em detalhes como funcionou o propinoduto na Vice-Presidência de Pessoa
Jurídica da Caixa Econômica Federal, entre 2011 e 2015, período em que Geddel
comandou a repartição. Funaro descreve o ex-ministro, “amigo e interlocutor de
Temer”, como um “forte arrecadador de doações e propinas”.
Em 2014, por exemplo, Funaro diz ter feito nove
entregas de dinheiro vivo a Geddel. Uma de 600.000 reais e outra de 500.000
reais em fevereiro, uma de 800.000 reais em março, 1 milhão em maio, mais 1
milhão em julho, 1,5 milhão em agosto, 3,2 milhões em setembro, 1,2 milhão em
outubro e 500.000 em dezembro. Em 2015, foram duas entregas de 500.000 reais
cada.
Durante os governos do ex-presidente Lula e da
ex-presidente Dilma Rousseff, o grupo do PMDB da Câmara apoderou-se de cargos
estratégicos no banco. Funaro conta que os peemedebistas usavam a influência
política para favorecer empresários dispostos a pagar milionárias propinas para
acessar as linhas de financiamento da Caixa.
Funcionava assim. Ora Lúcio Funaro ora Eduardo
Cunha faziam os contatos com empresários interessados em obter empréstimos
junto ao banco. Depois de negociar os valores da propina, Cunha negociava a
liberação dos recursos com Geddel, que ocupava a vice-presidência de Pessoa
Jurídica do banco. Quando o dinheiro saia, a propina era paga às empresas do
doleiro Lúcio Funaro, que providenciava a partilha da propina.
No período em que o PMDB comandou o esquema na
Caixa, cerca de 5 bilhões de reais, a sua maioria extraídos do FI-FGTS, um
fundo de investimentos em infraestrutura administrado pela Caixa, foram
liberados para empresas que pagaram aos peemedebistas mais de 170 milhões de
reais em propinas.
Lúcio conta que conheceu Geddel por intermédio de
Eduardo Cunha. O doleiro pagou propina pela primeira vez a Geddel depois de o
peemedebista ter favorecido o empresário Joesley Batista, da J&F, em um
negócio de 300 milhões de reais. O primeiro encontro ocorreu no hangar da Ibero
Star, no aeroporto de Salvador. Funaro desceu com a mala recheada de dinheiro,
conversou com Geddel por menos de dez minutos e voltou para o avião. Um
encontro frio e rápido.
Com o tempo, porém, as entregas tornaram-se cada
vez mais frequentes e Geddel, perdeu a cerimônia. Lúcio passou a entregar malas
de dinheiro para o peemedebista em hotéis de São Paulo e Salvador e até no
aniversário de 15 anos da filha de Geddel. O doleiro lembra que era comum, nas
entregas de propina, ser recebido por um Geddel ansioso no aeroporto. Segundo o
doleiro, durante os minutos que estava com o ex-ministro no hangar para repassar
as malas, os dois “conversavam brevemente sobre política e sobre as próximas
operações vislumbradas”. Lúcio diz no acordo que
A rotina de entregas seguiu firme e forte mesmo
depois da deflagração da Operação Lava-Jato. Lúcio conta que não interrompeu o
esquema porque ele e Geddel acharam que as investigações da Lava-Jato na
Petrobras não iriam se expandir para outros setores do governo. O esquema mudou
quando Lúcio passou a figurar como potencial alvo da polícia. O delator conta
que, um pouco antes de ser preso, recebeu um recado de Geddel para que
interrompesse os pagamentos. “Não… Para. Dá uma segurada e depois nós acertamos
isso aí”, disse Geddel.
A última operação realizada por Geddel na Caixa
ocorreu em 2015 e rendeu 20 milhões de reais em propina. O empresário Joesley
Bastista pediu a Funaro a liberação de um crédito de 2,7 bilhões de reais, para
a compra da Alpargatas, combinando o pagamento de uma comissão de 3% pela
operação. Lúcio pediu a Geddel a liberação do crédito no banco. Antes de receber
a propina, no entanto, Funaro foi alvo de mandados de busca e apreensão da
Polícia Federal, o que assustou Geddel, que avisou: “Deixa esse dinheiro aí com
você, não quero saber desse dinheiro, não sei o que pode lhe acontecer, se
precisar você já tem dinheiro contigo”
Fonte Veja.com Por Robson Bonin
Nenhum comentário:
Postar um comentário