NO MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, SERGIO MORO ABRIU AS PORTAS PARA O FBI
Sérgio Moro. Foto: Marcelo Camargo/Agência
Brasil
4 de maio de 2020
Publicado originalmente no site da
Agência Pública
Ex-juiz da Lava
Jato, Sergio Moro deixou o Ministério da Justiça clamando pela independência da
Polícia Federal (PF). Mas uma análise dos seus 16 meses à frente do ministério
mostra uma inclinação bem diferente – pelo menos no que diz respeito à influência
do FBI sobre a polícia brasileira
Meses de
investigação da Agência Pública em documentos oficiais revelam que, ao assumir
o Ministério da Justiça, o ex-juiz e o ex-diretor da PF Maurício Valeixo
assinaram acordos com o FBI, ampliando a influência americana em diferentes
áreas de combate ao crime, incluindo a presença dos agentes estrangeiros em um
centro de inteligência na fronteira, investigações sobre corrupção e acesso a
dados biométricos brasileiros.
No final de 2019,
o escritório do FBI no Brasil pediu um volume maior de recursos ao governo
americano para ampliar sua equipe e atender a mais pedidos de cooperação
internacional de investigações no país.
A aproximação de
Moro com o FBI vai além. Quando tirou uma licença não remunerada de cinco dias
em julho do ano passado, pouco depois da publicação dos documentos da Vaza Jato
pelo site The Intercept, é provável que o ex-ministro tenha se reunido com o
FBI em Washington, segundo documentos obtidos via Lei de Acesso à Informação
(LAI) (veja box abaixo).
Cinco dias
depois, o hacker Walter Delgatti foi preso pela PF e admitiu ter hackeado os
telefones de promotores da Vaza Jato.
Procurado pela
Pública, o ex-ministro Sergio Moro não respondeu aos questionamentos enviados
por email.
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É proibido ao FBI
realizar investigações em territórios estrangeiros – inclusive no Brasil –
porque a polícia americana não tem jurisdição no país.
A presença dos
agentes do FBI no Brasil foi revelada em 2004, quando o ex-diretor do FBI no
Brasil, Carlos Costa deu uma extensa entrevista ao jornalista Bob Fernandes na
revista Carta Capital. Em depoimento ao MPF na época, ele afirmou que o FBI
direcionava e financiava operações da PF, o que estabelecia uma relação de
“subordinação às autoridades norte-americanas”.
Investigando no Brasil
Embora as duas
maiores investigações da Lava Jato pelo Departamento de Justiça (DOJ) americano
já tenham terminado, com os acordos da Odebrecht e Petrobras, o FBI ainda tem
muito a fazer para investigar corrupção no Brasil, nas palavras do chefe do FBI
no país, David Brassanini, em palestra no 7º Congresso Internacional de
Compliance, em maio de 2019, em São Paulo.
A parceria com a
PF nas investigações da Lava Jato foi destacada por ele como uma aliança que
merece ser louvada. Foi a partir daí que a relação entre os agentes se
intensificou. Reportagem conjunta do site The Intercept Brasil e Pública
mostrou que desde 2015 os agentes do FBI estiveram em Curitiba para interrogar
os delatores que estavam fechando acordo com os procuradores brasileiros.
A cooperação foi
descrita por Brassanini como “fluida, sem problemas e transparente”, pois seus
agentes já tinham familiaridade com a cultura e a sociedade brasileiras. “A
habilidade de desenvolver e entender as peculiaridades locais é grande. Não só
a questão da língua, mas em entender realmente como o Brasil funciona, entender
as nuances”, afirmou.
O FBI atua para
investigar corrupção transnacional graças à legislação FCPA (Foreign Corrupt
Practices Act), uma lei que permite ao governo americano investigar e punir,
nos Estados Unidos, atos de corrupção que envolvam autoridades estrangeiras
praticados por empresas e pessoas estrangeiras. Os crimes não precisam ter
ocorrido em solo americano – basta, por exemplo, que tenha havido transferência
de dinheiro através de algum banco americano ou que as empresas envolvidas
vendam ações nas bolsas nos EUA. Foi com base nessa lei que o governo americano
puniu com multas bilionárias empresas brasileiras alvos da Lava Jato, entre
elas a Petrobras e a Odebrecht.
Brassanini relatou
também, no mesmo evento, que agentes do FBI vêm a São Paulo “toda semana para
tratar de diferentes casos que envolvem FCPA e lavagem de dinheiro”. Segundo
ele, a colaboração com a PF já rendeu muitas informações para os próximos anos.
“Agentes da Polícia Federal do Brasil me disseram recentemente que, mesmo que
eles não coletem nenhuma informação adicional, nem façam nenhum trabalho
investigativo, ainda assim eles teriam material para continuar inquéritos sobre
corrupção e lavagem de dinheiro pelos próximos cinco anos.”
Brassanini pediu
fundos adicionais ao DOJ para a operação no Brasil, o que permitirá ao
escritório ter uma equipe especializada em lidar com pedidos de colaboração
judicial. “O Brasil é o maior requerente de informações para evidência, inteligência
e casos tanto no Brasil quanto nos EUA”, afirmou à revista Latin Lawyer.
David Brassanini
é o chefão do FBI no Brasil desde agosto de 2017, mas desde 2006 atua no órgão
por aqui. É casado com uma brasileira, com quem tem quatro filhos, e é fluente
em português. Atualmente gerencia o trabalho do FBI na embaixada em Brasília e
nos consulados em São Paulo, Rio de Janeiro, Recife, Belo Horizonte e Porto
Alegre – incluindo a cooperação com a Lava Jato – uma equipe de 20 pessoas,
segundo a publicação especializada Global Investigative Review.
Foi ele o
principal articulador de uma postura mais “altiva” da polícia americana junto
ao ministério capitaneado por Moro. Além de se reunir com o próprio ministro no
começo do mandato, Brassanini encontrou-se com secretários e chegou a ter uma
reunião com o polêmico assessor especial do presidente Jair Bolsonaro, Filipe
Martins. O jovem olavista é um dos nomes que influenciam a política externa do
governo, ao lado de Eduardo Bolsonaro.
O encontro
ocorreu no dia 18 de julho de 2019, às 17h30, no Palácio do Planalto. Acusado
pelo deputado Alexandre Frota durante depoimento à CPI das Fake News de ter
apresentado Bolsonaro ao marqueteiro Steve Bannon e de “promover linchamentos
virtuais”, Martins foi convocado para comparecer à CPI para prestar
esclarecimentos sobre sua suposta participação no “gabinete do ódio”, gestor de
milícias digitais favoráveis ao presidente e centro de criação de fake news.
Dois meses antes,
o chefe do FBI no Brasil havia comparecido a um compromisso no campo oposto ao
de Martins: um debate no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para discutir,
justamente, como as fake news podem ser usadas para manipular eleições.
Brassanini já havia participado, no dia 17 de maio, de um evento com o diretor
do departamento de cooperação e observação eleitoral da Organização dos Estados
Americanos (OEA), Gerardo de Icaza, quando falou sobre o combate a crimes
cibernéticos e mencionou a criação de uma força-tarefa internacional sobre
interferência estrangeira em eleições. O Brasil foi convidado para participar,
ao lado da Índia.
No encontro com
Filipe Martins, Brassanini estava acompanhado de William Popp, encarregado de
negócios da embaixada dos Estados Unidos.
Meses depois,
estava de volta ao centro do palco em um grande evento de treinamento de
policiais federais e procuradores no Itamaraty, que ocorreu nos dias 5 e 6 de
setembro de 2019. O DOJ, o FBI e a Securities and Exchange Commission (SEC)
realizaram um Treinamento em Combate à Corrupção e Suborno Transnacional em
parceria com o Ministério Público Federal (MPF), a Controladoria-Geral da União
(CGU) e o governo federal.
Enquanto em 2018,
durante o governo de Michel Temer, Brassanini fez apenas uma “visita de
cortesia” a Rogério Galloro, então secretário nacional de Justiça Nacional,
foram pelo menos quatro agendas oficiais em 2019.
Além delas, a
reportagem localizou mais cinco reuniões de membros do Ministério da Justiça
com adidos da embaixada americana, incluindo um “coquetel” oferecido pelo FBI
durante a reunião de policiais de 12 países para discutir criptografia, evento
chamado “Going Dark” e promovido por Moro em fevereiro.
A primeira visita
ocorreu logo no começo do governo. Em 17 de janeiro de 2019, o ministro Sergio
Moro recebeu uma delegação de autoridades norte-americanas para discutir
maneiras de aprofundar a cooperação jurídica do Brasil com os Estados Unidos,
segundo o site do Ministério da Justiça. Moro falou sobre seu pacote anticrime,
que ainda não havia sido apresentado ao Congresso (uma versão mais branda
acabou sendo aprovada em dezembro). Além de Brassanini, estavam na reunião
assessores de políticas do Tesouro dos EUA, o encarregado de negócios Doug
Koneff, o diretor econômico Frank DeParis e a conselheira política Kristin
Kane, todos funcionários da embaixada.
Na semana
seguinte, no dia 24, Brassanini reuniu-se durante toda a manhã com Jorge
Barbosa Pontes, da Diretoria de Ensino e Estatística do Ministério da Justiça,
assim como o General Theophilo, então secretário da Secretaria Nacional de
Segurança Pública. Segundo a agenda oficial do diretor, a pauta da reunião foi
uma parceria para capacitação na Academia Nacional de Segurança Pública do
ministério.
No dia anterior
quem havia visitado a Diretoria de Ensino e Estatística foi o adido policial
americano Jason Smith, acompanhado de dois outros representantes da embaixada.
Em 12 de agosto,
Brassanini voltou a se reunir com Jorge Pontes e com outros secretários, entre
eles o de operações integradas do Ministério da Justiça, Rosalvo Ferreira; o
coordenador-geral de combate ao crime organizado, Rodrigo de Sousa Alves, o
secretário adjunto José Washington Luiz Santos, o diretor de inteligência da
Secretaria de Operações Integradas, Marcos Aurélio Pereira de Moura, e o
diretor de inteligência, Fábio Galvão da Silva Rêgo.
Estavam presentes
nessas reuniões o adido de segurança regional da embaixada dos Estados Unidos
em Brasília, Jason Smith, e uma delegação de agentes especiais do Serviço de
Segurança Diplomática do Departamento de Estado. As reuniões giraram em torno
de dois projetos de parceria: “Discussões sobre o projeto de biometria e
criação do fusion center”, segundo registro oficial.
As informações
biométricas estão no centro de um acordo assinado em 18 de março de 2019,
durante visita oficial de Moro e do ex-diretor-geral da PF Maurício Valeixo a
Washington, na qual acompanharam a primeira visita oficial do presidente Jair
Bolsonaro. Moro teve reunião com a então secretária de Segurança Interna
Kirstjen Nielsen e com o diretor do FBI, Christopher A. Wray. Ele almoçou com
membros do FBI e da PF na churrascaria The Capital Grille, segundo a Folha de
S.Paulo, de acordo com a agenda oficial, o almoço foi oferecido pelo diretor
adjunto do FBI, Charles Spencer.
O acordo assinado
entre Valeixo e Christopher A. Wray, obtido pela Pública via LAI, visa à troca
de informações sobre grupos criminosos e terroristas a partir do
compartilhamento de impressões digitais de cidadãos dos dois países para fins
de investigações criminais.
Qualquer uma das
polícias pode pedir impressões digitais e outros dados identificadores, como
nome, número de seguro social, número de CPF e de identidade, local e data de
nascimento em casos que envolvem “indivíduo sobre o qual exista suspeita
razoável de que seja terrorista” ou “indivíduos sobre os quais existe a
suspeita de terem cometido crimes graves ou atividades criminosas
transnacionais”. Crimes graves, segundo o acordo, são todos aqueles cuja pena
seja superior a um ano de prisão.
As impressões
digitais serão inseridas pelo FBI em bases de dados nacionais americanas, às
quais outras agências do governo federal dos EUA e governos estaduais têm
acesso, segundo o documento.
Em outubro do ano
passado, Bolsonaro assinou um decreto estabelecendo uma base de dados única, o
Cadastro Base do Cidadão, que vai interligar diferentes bases de dados sobre os
cidadãos brasileiros, incluindo números de registros e documentos, dados
biográficos e biométricos, como “palma da mão, as digitais dos dedos, a retina
ou a íris dos olhos, o formato da face, a voz e a maneira de andar”. O decreto
surge ao mesmo tempo em que avança a coleta de dados biométricos da população,
como a biometria para as eleições, por exemplo, que alcançou 120 milhões de
eleitores este ano.
“Dados
biométricos, de acordo com a Lei Geral de Proteção de Dados, são dados
sensíveis. O compartilhamento desses para formar esse Cadastro Base do Cidadão
permite que mais dados, sensíveis ou não, sejam utilizados, de maneira a
extrapolar os fins para que foram coletados”, diz Joana Varon, diretora da
organização Coding Rights, que defende a privacidade de dados.
Joana afirma que
o acordo assinado por Valeixo pode levar a abusos, já que a definição do que
seria um “suspeito” é bastante ampla. “Acordos de cooperação policial, que
envolvem troca de dados sensíveis, como os dados biométricos, precisam ser mais
específicos e delimitados para garantir que essa troca de informação seja
realmente necessária e proporcional aos fins que se destinam, ainda mais no
momento político em que vivemos.”
Segundo ela, o
tratado pode ter mais peso num contexto de ameaça institucional à PF. “Esses
limites são ainda mais importantes se considerarmos que o governo Bolsonaro
conduz uma política de total subserviência ao governo norte-americano, bem como
se levarmos em conta que vivemos momentos de crise democrática e de ameaças de
interferências políticas na Polícia Federal”, conclui.
Na mesma ocasião,
Maurício Valeixo também assinou um acordo com o Chefe de Alfândega e proteção
de Fronteira dos EUA, Kevin K. McAleenan, para permitir que um delegado da PF
brasileira fique lotado no Centro Nacional de Identificação de Ameaças, e, ao
mesmo tempo, que um agente do Departamento de Segurança Interna dos EUA fique
lotado junto à PF no Brasil, para coordenar ações de segurança de fronteiras.
“Fusion Center” na Tríplice Fronteira
O “Fusion Center”
– ou Centro Integrado de Operações na Fronteira (Ciof) – é um escritório de
inteligência na Tríplice Fronteira de Foz do Iguaçu que pretende reunir agentes
de 16 instituições e unificar bancos de dados. O modelo é inspirado no centro
comandado pela DEA, a agência antidrogas americana, na fronteira com o México,
que Moro visitou em junho do ano passado – no auge da polêmica da Vaza Jato. Na
época, especulou-se que a visita de Moro teria a ver com a publicação dos
vazamentos no dia 9 de junho pelo The Intercept, uma vez que a agenda não foi
divulgada à imprensa.
A agenda oficial
de Moro começou no dia 24 de junho de 2019. Ele estava acompanhado por Maurício
Valeixo, pelo diretor executivo da Polícia Rodoviária Federal, José Lopes Hott
Júnior, e pelo assessor especial do ex-ministro, o agente da PF Marcos Koren.
O roteiro
incluiu, no primeiro dia, uma visita ao Centro de Inteligência de El Paso,
liderado pela DEA, que conta com uma dúzia de agentes do FBI para monitorar a
fronteira americana com o México. Depois da visita, Moro anunciou que
destacaria permanentemente um delegado da PF para operar no centro de
inteligência norte-americano, ampliando a troca de informações.
A seguir, no dia
25 de junho, fez uma visita às Forças-Tarefa Conjuntas de Combate ao Terrorismo
do FBI. Mas teve de reduzir o tempo de viagem para retornar ao Brasil. A visita
estava sendo negociada desde maio com Brassanini, segundo documentos entregues
em resposta a um pedido de informações do deputado federal Márcio Jerry, do
PCdoB do Maranhão, ao qual a Pública teve acesso.
Desde o dia 2 de
maio – antes portanto do vazamento dos diálogos pelo The Intercept –,
Brassanini discutia reservas de hotéis para os brasileiros. Inicialmente, a
visita ocorreria no começo do mês. O pedido oficial para a viagem foi feito por
Moro três dias antes da publicação do vazamento, no dia 6 de junho.
Segundo o
documento do ministério, a agenda foi conduzida pelo adido policial Jason
Smith, o mesmo que estaria em agosto em reuniões na esplanada.
Em Setembro, Moro
voltou a falar do Fusion Center com uma delegação americana no Palácio da
justiça em Brasília, dessa vez com o Diretor-Geral Adjunto do Departamento de
Segurança Interna dos EUA, David Peter Pekoske.
Brassanini recebe tour VIP em Foz do Iguaçu
O Centro
Integrado de Operações na Fronteira é o projeto dos sonhos da embaixada
americana, que, há pelo menos dez anos, pressiona o governo brasileiro para
investigar suspeitas de atividades terroristas na região – atitude que
enfrentava resistência dos governos petistas, conforme revelaram documentos
diplomáticos publicados pelo WikiLeaks. Em janeiro de 2008, por exemplo, o
embaixador reclamava que o governo de Lula “se recusa a classificar, de forma
oficial ou até retórica, grupos considerados terroristas pelos Estados Unidos,
como o [palestino] Hamas, [o libanês] Hezbollah e [a guerrilha colombiana]
Farc”, que estariam na região da Tríplice Fronteira.
O centro foi
finalmente inaugurado em 16 de dezembro no Parque Tecnológico da Usina de
Itaipu, em Foz do Iguaçu. Um mês antes, Brassanini fez um tour especial às
instalações, guiado por ninguém menos que Sergio Moro.
Em 6 de novembro
de 2019, o ex-ministro levou uma pequena comitiva americana para apresentar o
projeto. Estavam o cônsul americano, Adam Shub, e membros do FBI – entre eles
David Brassanini, conforme mostra foto publicada pelo site G1. “Os Estados
Unidos têm sido um grande parceiro do Brasil nessa atividade, ou em outras
também, e nós estamos aproveitando o modelo que já foi construído. Nós pedimos
ajuda em treinamento e equipamentos”, disse Moro.
O centro vai
manejar bancos de dados unificados a partir da atuação conjunta de membros da
PF, Polícia Rodoviária Federal, Agência Nacional de Inteligência (Abin),
Ministério da Defesa, Unidade de Inteligência Financeira (UIF, antigo Coaf),
Receita Federal, Polícia Militar, Polícia Civil, Polícia Científica para
combater o crime organizado na Tríplice Fronteira, em Foz do Iguaçu. Estarão
também presentes “adidos [policiais] de outros países”, segundo Moro afirmou ao
jornal local Tarobá News.
De acordo com o
ministério, o centro vai atuar principalmente no combate ao tráfico de armas e
drogas. As equipes vão monitorar também movimentações financeiras ilegais.
No dia seguinte à
visita, Moro anunciou a assinatura de um acordo com o Paraguai, o Uruguai e a
Argentina que permite que policiais possam cruzar a fronteira para atuar nos
países vizinhos durante uma perseguição. Sem o acordo, a atuação de forças
policiais estrangeiras em outro país é ilegal, uma vez que não têm jurisdição
em solo estrangeiro.
“É como se
houvesse uma força-tarefa permanente, com o objetivo de prevenir e reprimir
crime de fronteira (contrabando, tráfico de drogas e armas, financiamento ao terrorismo
e proteção de estruturas críticas para o país). Por isso, a localização
estratégica em Itaipu”, afirmou Moro, no dia da inauguração, um mês depois.
Na mesma semana,
o FBI criou uma equipe especializada em temas como terrorismo e tráfico de
drogas para atuar no Paraguai, segundo a agência Associated Press.
A terceira viagem aos Estados Unidos
Um mês depois das
primeiras publicações dos diálogos da Vaza Jato, Sergio Moro viajou pela
terceira vez no ano aos Estados Unidos, quando tirou uma “licença não
remunerada” para uma semana de “férias” com a esposa. O casal passou de 15 a 19
de julho na capital americana, tirando fotos diante da Casa Branca e demais
pontos turísticos. Mas a reportagem apurou que ele provavelmente se reuniu,
também, com o FBI, fora da agenda oficial e longe do escrutínio público.
O colaborador da
Pública Jeremy Bigwood questionou via LAI o FBI sobre se há registros de
reuniões com o ministro na época. A polícia americana respondeu que “não pode
confirmar nem negar” a existência de tais registros, uma maneira usada por
órgãos americanos que equivale a reconhecimento tácito, quando não se pode
negar veementemente uma afirmação.
A reportagem da
Pública recorreu e pediu mais informações.
Cinco dias depois
do retorno de Moro ao Brasil, o Walter Delgatti Neto foi preso em uma operação
da PF e confessou ter hackeado as mensagens de Telegram de integrantes da
força-tarefa da Lava Jato.
O FBI pisa em ovos
Impedidos de
fazer investigações em territórios estrangeiros – inclusive no Brasil –, agentes
como Brassanini pisam em ovos quando têm de explicar o seu trabalho. Um vídeo no YouTube oficial da agência
americana, gravado por ele quando era chefe do hemisfério das Américas do FBI,
mostra claramente esse constrangimento.
“Embora nós
possamos não ter jurisdição no país onde estamos localizados […], temos a
habilidade de procurar e falar com nossos parceiros, que têm jurisdição,
trabalhar com eles, e dizer: ‘Hey, estamos procurando esse fugitivo, você sabe
onde ele está? Podemos te ajudar? Há algo que você possa precisar para ajudar a
encontrá-lo, seja treinamento, seja outras técnicas sofisticadas que podemos
usar para identificar, encontrar esse fugitivo?’.”
O FBI e a
embaixada se negam a detalhar publicamente o que fazem seus agentes no Brasil.
Mas um documento da própria embaixada revela como funciona esse trabalho.
Trata-se de um anúncio em 19 de outubro de 2019 em busca de um “investigador de
segurança” para trabalhar na equipe do adido legal e passar 70% do tempo
fazendo investigações. “Essas investigações são frequentemente altamente
controversas, podem ter implicações sociais e políticas significativas”, diz o
texto do anúncio, escrito em inglês.
Entre as tarefas
listadas estão “assistência investigativa relacionada com violações da lei dos
EUA” a agentes de segurança pública, incluindo o Ministério da Justiça,
polícias Federal, Civil e Militar e a Procuradoria Geral da República (PGR).
Assim, “a posição requer uma habilidade de interagir em um nível profissional
com membros da comunidade de segurança em alto escalão e nível operacional em
temas operacionais e de relacionamento”.
O profissional
deve “comparecer com (ou algumas vezes sem) a equipe do adido legal a reuniões
com membros do alto escalão do governo brasileiro”, acompanhar a imprensa
brasileira e manter “bases de dados investigativas e de treinamento
relacionadas aos contatos de ligação, conferências, tópicos, palestrantes,
fotos, e materiais que podem ser facilmente acessados para avaliação (compiling
evaluations), conforme necessário”.
O anúncio avisa
que o policial terá de viajar de carro, barco, trem ou avião por até 30 dias.
“Viagens para áreas remotas de fronteira e para todas as regiões do Brasil
serão requeridas.” Não é divulgado o valor do salário.
Fonte:
Diário do Centro do Mundo (D. C. M.)
por Natália Viana da Agencia
Brasil
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